AS SUFRAGISTAS




Gênero: drama
Direção: Sarah Gavron
Roteiro: Abi Morgan
Elenco: Carey Mulligan, Helena Bonham Carter , Anne-Marie Duff, Brendan Gleeson, Ben Whishaw, Romola Garai, Geoff Bell, Samuel West,  Natalie Press, Meryl Streep, Grace Stottor, Adrian Schiller, Adam Michael Dodd, Sarah Finigan. Produção: Alison Owen, Faye Ward
Fotografia: Eduard Grau
Montador: Barney Pilling
Trilha Sonora: Alexandre Desplat
Duração: 106 min.
Ano: 2015
País: Reino Unido
Cor: Colorido
Estreia: 24/12/2015 (Brasil)
Distribuidora: Universal Pictures
Estúdio: Film4 / Ingenious Media / Pathé / Ruby Films
Classificação: 14 anos

Sinopse: em 1912, na Inglaterra, jovem lavadeira se envolve com o movimento sufragista, que lutava pelos direitos políticos das mulheres.



Nota do Razão de Aspecto:


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Em uma época em que as lutas de diversos grupos sociais por direitos básicos ainda é uma realidade, um filme como As sufragistas vem em boa hora. Baseado em fatos reais ocorridos na Inglaterra do anos 1910 (ainda que a personagem protagonista do filme seja fictícia), o filme conta a história de um momento chave na busca das mulheres daquele país pelo direito ao voto - como objetivo mais imediato - e pelo direito a manifestar seu pensamento e suas demandas na sociedade. Algo extremamente simples, chamado respeito.

A direção é de Sarah Gavron, em seu primeiro longa de peso, e o roteiro é de Abi Morgan (a mesma de "Shame", "The Iron Lady"e da série de TV "The Hour"). O enredo concentra-se na personagem Maud Watts (Carey Mulligan), esposa e mãe, que passa seus dias trabalhando como lavadeira em condições extenuantes de trabalho. Sua mãe fora lavadeira, e desde os sete anos de idade é esse o destino que lhe se afigura, sujeita não só a condições de trabalho ruins, mas à submissão a um chefe abusivo (Geoff Bell) e a um marido que, embora carinhoso e dedicado, é espelho do pensamento de sua época: as mulheres estariam muito bem sob os cuidados de seus pais, maridos ou irmãos, e não teriam o equilíbrio psicológico suficiente para serem sujeitas de seus próprios direitos.

Nesse contexto, Maud entra em contato com o movimento das sufragistas por meio de sua colega de trabalho Violet (Anne-Marie Duff). Tendo tentado por décadas (séculos?) uma ampliação dos direitos das mulheres, o movimento age desde por meio de tentativa de diálogo com o Parlamento até a destruição de vitrines de lojas e outras tentativas de ganhar espaço na mídia, para que possa ser realmente ouvido. Liderado por Emmeline Pankhurst (Meryl Street), figura algo messiânica, foragida da polícia, e tendo como uma de suas principais oficiais de campo em Edith Ellyn (Helena Bonham-Carter), o filme acompanha justamente a escalada dessas ações, em que a protagonista Maud acabará envolvida. Enquanto isso, o Inspetor Arthur Steed (Brendan Gleeson), começa a estudar e investigar as envolvidas, de forma a combater as atividades das agitadoras.

O filme retrata com competência o arco dramático da protagonista, que vai desde o princípio do interesse de Maud pelo movimento sufragista até sua afirmação como ativista, passando por todo o drama de lidar com as reações de seu marido e da sociedade. 

Carey Mulligan interpreta Maud com entrega, especialmente nas cenas de maior fragilidade, mas talvez lhe falte algum carisma como atriz (e convém ela perder o cacoete de entortar a boca para a esquerda para esboçar boa parte de suas reações). Bonham-Carter é sempre competente, e aqui está mais contida do que costumamos vê-la. A melhor entre as atrizes é Anne-Marie Duff, que faz uma Violet intensa, com o sotaque correto e com um arco que contrapõem o da protagonista. Entre os homens, Ben Wishaw (o novo Q dos filmes de James Bond, e que despontou pro mundo em "Perfume", de 2006) continua provando ser um dos atores mais interessantes de sua geração, e Brendan Gleeson está excepcional no papel do inspetor de polícia.

Uma das grandes qualidades do filme é não cair na tentação de estabelecer uma dualidade heroinas X vilões entre homens e mulheres. Há homens canalhas, como o dono da lavanderia, homens que dão suporte parcial ou total ao movimento (como o caso do marido de Edith) e outros que entendem e concordam com as ideias sufragistas, mas que optam por seguir a lei. Entre as mulheres, há diferentes tipos de engajamento na luta pelo sufrágio, além das reações contrárias a essa ideia, que oscilam entre o medo e a condenação social.

Vale uma menção especial - que pode inclusive ser indicada a diversos prêmios - à parte de cenários e figurino do filme, que compõem com excelência o período histórico desejado. Como curiosidade, o longa foi o primeiro a ser autorizado pelo Parlamento Britânico a realizar filmagens em seu interior desde a década de 1950. Os responsáveis por essa parte do filme foram Alice Normington (design de produção), Jonathan Houlding e Choi Ho Man (direção de arte), Barbara Herman-Skelding (decoração de cenários) e Jane Petrie (figurino).

Outro ponto positivo do filme é a trilha sonora de Alexandre Desplat (compositor que venceu o Oscar pela trilha de "O grande Hotel Budapeste", e indicado sete vezes nos últimos nove anos). Embora se utilize de recursos não exatamente originais, como o uso de percussão emulando batimentos cardíacos em cenas mais tensas, a trilha sonora mistura beleza e discrição nos momentos certos.



E quanto a Meryl Streep?  Pois é, sua participação no filme é mais ou menos do tamanho da participação nesta crítica. Sua Pankhurst não passa de uma ponta de menos de cinco minutos do filme, feita com alguma afetação, e sujeita de diálogos "inspiradíssimos" como "nunca desista!". A presença da atriz no material de divulgação do filme beira a propaganda enganosa.


Entre as imperfeições do filme, incluem-se seu letreiro inicial, didático e desnecessário, além de um uso meio indeciso sobre a câmera na mão. O segundo ato, ademais, tem problemas de ritmo e torna-se o ponto fraco do filme. Além disso, o clímax - que, embora retrate um acontecimento real, não mencionarei porque boa parte dos espectadores (na qual me incluía antes de assistir ao filme) não conhece os detalhes da época - é catalisado por uma personagem que, até então, passara quase despercebida na trama. Ao optar por centrar-se na vida de Maud, a diretora faz com que @s espectador@s se identifiquem com sua trajetória. Neste momento final, entretanto, fica a impressão de que estávamos acompanhando a história errada até então.


Escrito, dirigido e tendo como protagonistas mulheres, "As sufragistas", embora não chegue a ser espetacular, é um filme competente do ponto de vista de reconstituição histórica e, por que não, necessário. Passado mais de um século desde os eventos do filme, as conquistas legais das mulheres têm, infelizmente, andado a passos muito mais largos do que as conquistas no imaginário social.


PS: Faltou citar, no letreiro final do filme, que o primeiro país a garantir plenos direitos políticos para as mulheres foi a Finlândia, em 1906.

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